
Por Souza Jamba
O predomínio absoluto do MPLA não é saudável para o futuro da democracia em Angola. Num sistema democrático sadio, precisa-se de instituições - a imprensa, o sistema judiciário etc. etc. - que possam servir como um travão a qualquer sector que tente centralizar o poder. O que vemos em Angola é a centralização de tudo em torno de uma elite restrita cada vez mais ciosa do poder absoluto. Infelizmente, o grande partido que é o MPLA poderá ser usado para o estabelecimento de um sistema tirânico em Angola.
Todos nós vamos ter que resistira esses manobras que, sem bem- sucedidas, só contribuirão para acorrentar o progresso do nosso país. Sou leitor assíduo da historia africana. Uma das perguntas que sempre faço é como, nos anos 60, vários intelectuais deixaram que os seus países fossem transformados em ditaduras com líderes que não prestavam contas a ninguém. Os sistemas de partido único, que começaram a ser desfeitos nos anos 90, foram instalados em vários países com a bênção dos respectivos parlamentos. No Malawi, o Dr. Ngwazi Hastings Kamuzu Banda fez-se presidente vitalício através do Malawi Congress Party em 1971. Naquele altura muitos intelectuais do Congress Party defendiam caninamente Kamuzu Banda. Só que, uma vez consolidado o seu poder, Banda virou-se contra esses intelectuais, perseguindo-os impiedosamente.
É verdade que a história de Angola difere muito da de muitos países africanos. Por causa da prolongada guerra, em Angola só agora a disputa política substituiu a disputa militar. Esses são os nossos primeiros passos em democracia. É por isso que temos de ter muito cuidado: se forem adoptadas medidas que actuem contra o espírito fundamental da democracia, como a introdução da eleição indirecta do Presidente da República, isso significará a amputação da nação. O MPLA tem o dever histórico de utilizar a sua maioria no parlamento para promover uma democracia em que todos os intervenientes sejam tratados de forma justa. O MPLA tem que utilizar a sua maioria no parlamento para promover a cultura de transparência. O MPLA não pode pensar apenas em vantagens pontuais; os líderes deste partido têm que pensar nos interesses da nação a longo prazo. Nós os angolanos na disporá, deveríamos começar a pressionar os lideres do MPLA para defenderem a nascente democracia. Acontece, porém, que são cada vez menos as pessoas que têm coragem de criticar o MPLA. É que aqui como em Angola muitas pessoas estão a fazer tudo para ingressarem neste partido. Gente que até ontem dizia ser da UNITA, que pediu asilo politico em vários países Ocidentais alegando perseguição do Governo angolano e até mesmo do MPLA, está hoje envolvida em lutas para ganhar postos na estruturas do mesmo partido. Células do MPLA são constituídas diariamente em vários países ocidentais.
Nos países ocidentais subitamente muita gente passou a mostrar um interesse pouco comum no que vai acontecendo no MPLA porque tem- se a noção de que só aqueles que estão ligados ao partido é que podem ascender social e economicamente em Angola. Na Grã-Bretanha alguns membros da comunidade angolana ficaram incomodados ao saber que um antigo inquilino habitual das prisões de sua Majestade é agora o responsável da JMPLA. Na Alemanha, uma antiga militante do MPLA, altamente enfurecida, escreveu um ensaio para denunciar o que diz ser um elevadíssimo número de antigos militantes da Unita que, agora, reclamam ser verdadeiros membros do MPLA. Há gente na diáspora a pensar que quando regressar a Angola o que será considerado é a sua militância no MPLA e não as sua aptidões académicas.
Muitos desses novos militantes do MPLA sabem pouco ou quase nada do programa do partido; esses indivíduos iriam mesmo para o MPLA mesmo se amanha ele abandonasse oficialmente a actual preferência pela economia do mercado e optasse pelo leninismo puro, antecâmara para a instalação de uma ditadura do proletariado. Aqui no Ocidente está a ganhar terreno a ilusão de que quem quer avançar na vida tem forçosamente que aderir ao MPLA porque ele é que determina o avanço social de cada um.
Tem-se a impressão de que adere-se ao MPLA para ter contactos de peso. É por isso que em Angola há órgãos absurdos como Comité de Economistas do MPLA. Através deles muitas pessoas vivem com a noção de estarem muito próximas do poder. É o MPLA que abre as portas de acesso ao poder. Esta filosofia, que ganha terreno, vai completamente contra o espírito da meritocracia. Em vários países africanos já houve partidos muito poderosos e aparentemente inatacáveis. Com o andar do tempo, esses partidos tornaram-se corruptos e alienaram o público. Há quem diga que o MPLA poderá, à semelhança do Partido Revolucionário Institucional no México, permanecer no poder por mais de 70 anos. Duvido muito que isso possa acontecer em Angola. Não
Não há dúvida que o MPLA esforça-se para ter as suas mãos em todos aspectos da vida social – cultura, desporto, e até mesmo religião. Estive em Angola durante a campanha para as eleições legislativas de 2008. Nessa altura vi mesmo igrejas que, depois de uma visita (e possivelmente de uma prenda de uma alta figura do MPLA) passavam a apoiar publicamente o partido no poder. Há músicos angolanos que parecem passar a vida a actuar apenas em funções dos patrocínios dó MPLA. Será que o Ministério da Cultura angolano poderá ajudar o desenvolvimento de um artista que não seja do MPLA? Duvido!
Em Angola não existe uma distinção clara entre o partido no poder e o estado. Os partidos da oposição e a sociedade civil deveria fazer tudo para incutir no público que o estado é uma coisa e o partido no poder uma outra. Tem-se a noção de que todos os funcionários públicos devem pertencer ao partido no poder. Em Angola já houve situações em que funcionários públicos tiveram que deixar os seus postos do trabalho para acolherem o vice-presidente do partido no poder. Aqui no ocidente as estruturas do que nascem como cogumelos operam com a bênção e apoio material das embaixadas de Angola. Durante a campanha eleitoral, o partido no poder utilizou com muita impunidade, os recursos do estado. O próprio MPLA não gostaria que, uma vez fora do poder, um outro partido não praticasse um fair-play? Como já disse, numa democracia saudável tem que haver a possibilidade de alternância; isto é algo que, a longo prazo, poderá beneficiar todos os angolanos, mesmo os militantes do MPLA. Mas para isso é necessário que a oposição angolana faça tudo para conquistar o seu devido espaço na cena politica. Este espaço só será conquistado se as figuras que controlam o poder pensarem nos interesses da nação e não só no prolongamento da irreversibilidade do MPLA. ■
Fonte: Semanário angolense, 334, 19 setembro 09
O predomínio absoluto do MPLA não é saudável para o futuro da democracia em Angola. Num sistema democrático sadio, precisa-se de instituições - a imprensa, o sistema judiciário etc. etc. - que possam servir como um travão a qualquer sector que tente centralizar o poder. O que vemos em Angola é a centralização de tudo em torno de uma elite restrita cada vez mais ciosa do poder absoluto. Infelizmente, o grande partido que é o MPLA poderá ser usado para o estabelecimento de um sistema tirânico em Angola.
Todos nós vamos ter que resistira esses manobras que, sem bem- sucedidas, só contribuirão para acorrentar o progresso do nosso país. Sou leitor assíduo da historia africana. Uma das perguntas que sempre faço é como, nos anos 60, vários intelectuais deixaram que os seus países fossem transformados em ditaduras com líderes que não prestavam contas a ninguém. Os sistemas de partido único, que começaram a ser desfeitos nos anos 90, foram instalados em vários países com a bênção dos respectivos parlamentos. No Malawi, o Dr. Ngwazi Hastings Kamuzu Banda fez-se presidente vitalício através do Malawi Congress Party em 1971. Naquele altura muitos intelectuais do Congress Party defendiam caninamente Kamuzu Banda. Só que, uma vez consolidado o seu poder, Banda virou-se contra esses intelectuais, perseguindo-os impiedosamente.
É verdade que a história de Angola difere muito da de muitos países africanos. Por causa da prolongada guerra, em Angola só agora a disputa política substituiu a disputa militar. Esses são os nossos primeiros passos em democracia. É por isso que temos de ter muito cuidado: se forem adoptadas medidas que actuem contra o espírito fundamental da democracia, como a introdução da eleição indirecta do Presidente da República, isso significará a amputação da nação. O MPLA tem o dever histórico de utilizar a sua maioria no parlamento para promover uma democracia em que todos os intervenientes sejam tratados de forma justa. O MPLA tem que utilizar a sua maioria no parlamento para promover a cultura de transparência. O MPLA não pode pensar apenas em vantagens pontuais; os líderes deste partido têm que pensar nos interesses da nação a longo prazo. Nós os angolanos na disporá, deveríamos começar a pressionar os lideres do MPLA para defenderem a nascente democracia. Acontece, porém, que são cada vez menos as pessoas que têm coragem de criticar o MPLA. É que aqui como em Angola muitas pessoas estão a fazer tudo para ingressarem neste partido. Gente que até ontem dizia ser da UNITA, que pediu asilo politico em vários países Ocidentais alegando perseguição do Governo angolano e até mesmo do MPLA, está hoje envolvida em lutas para ganhar postos na estruturas do mesmo partido. Células do MPLA são constituídas diariamente em vários países ocidentais.
Nos países ocidentais subitamente muita gente passou a mostrar um interesse pouco comum no que vai acontecendo no MPLA porque tem- se a noção de que só aqueles que estão ligados ao partido é que podem ascender social e economicamente em Angola. Na Grã-Bretanha alguns membros da comunidade angolana ficaram incomodados ao saber que um antigo inquilino habitual das prisões de sua Majestade é agora o responsável da JMPLA. Na Alemanha, uma antiga militante do MPLA, altamente enfurecida, escreveu um ensaio para denunciar o que diz ser um elevadíssimo número de antigos militantes da Unita que, agora, reclamam ser verdadeiros membros do MPLA. Há gente na diáspora a pensar que quando regressar a Angola o que será considerado é a sua militância no MPLA e não as sua aptidões académicas.
Muitos desses novos militantes do MPLA sabem pouco ou quase nada do programa do partido; esses indivíduos iriam mesmo para o MPLA mesmo se amanha ele abandonasse oficialmente a actual preferência pela economia do mercado e optasse pelo leninismo puro, antecâmara para a instalação de uma ditadura do proletariado. Aqui no Ocidente está a ganhar terreno a ilusão de que quem quer avançar na vida tem forçosamente que aderir ao MPLA porque ele é que determina o avanço social de cada um.
Tem-se a impressão de que adere-se ao MPLA para ter contactos de peso. É por isso que em Angola há órgãos absurdos como Comité de Economistas do MPLA. Através deles muitas pessoas vivem com a noção de estarem muito próximas do poder. É o MPLA que abre as portas de acesso ao poder. Esta filosofia, que ganha terreno, vai completamente contra o espírito da meritocracia. Em vários países africanos já houve partidos muito poderosos e aparentemente inatacáveis. Com o andar do tempo, esses partidos tornaram-se corruptos e alienaram o público. Há quem diga que o MPLA poderá, à semelhança do Partido Revolucionário Institucional no México, permanecer no poder por mais de 70 anos. Duvido muito que isso possa acontecer em Angola. Não
Não há dúvida que o MPLA esforça-se para ter as suas mãos em todos aspectos da vida social – cultura, desporto, e até mesmo religião. Estive em Angola durante a campanha para as eleições legislativas de 2008. Nessa altura vi mesmo igrejas que, depois de uma visita (e possivelmente de uma prenda de uma alta figura do MPLA) passavam a apoiar publicamente o partido no poder. Há músicos angolanos que parecem passar a vida a actuar apenas em funções dos patrocínios dó MPLA. Será que o Ministério da Cultura angolano poderá ajudar o desenvolvimento de um artista que não seja do MPLA? Duvido!
Em Angola não existe uma distinção clara entre o partido no poder e o estado. Os partidos da oposição e a sociedade civil deveria fazer tudo para incutir no público que o estado é uma coisa e o partido no poder uma outra. Tem-se a noção de que todos os funcionários públicos devem pertencer ao partido no poder. Em Angola já houve situações em que funcionários públicos tiveram que deixar os seus postos do trabalho para acolherem o vice-presidente do partido no poder. Aqui no ocidente as estruturas do que nascem como cogumelos operam com a bênção e apoio material das embaixadas de Angola. Durante a campanha eleitoral, o partido no poder utilizou com muita impunidade, os recursos do estado. O próprio MPLA não gostaria que, uma vez fora do poder, um outro partido não praticasse um fair-play? Como já disse, numa democracia saudável tem que haver a possibilidade de alternância; isto é algo que, a longo prazo, poderá beneficiar todos os angolanos, mesmo os militantes do MPLA. Mas para isso é necessário que a oposição angolana faça tudo para conquistar o seu devido espaço na cena politica. Este espaço só será conquistado se as figuras que controlam o poder pensarem nos interesses da nação e não só no prolongamento da irreversibilidade do MPLA. ■
Fonte: Semanário angolense, 334, 19 setembro 09





